quarta-feira, 5 de abril de 2017

Família Tradicional Brasileira


Depois de longos meses sem escrever, retomo de uma forma um tanto diferente.
É interessante perceber o tempo passar, a maturidade (e a idade) avançar, os aprendizados acontecerem, os desafios serem postos à prova. Gratidão por tudo isso!

Neste retorno, queria partilhar algumas ideias acerca de um tema que está na boca do povo atualmente.


Um artista global violenta sua esposa, o caso vira assunto geral, viralizam-se comentários dos mais esdrúxulos possíveis. 
Quero então falar da Violência contra a Mulher e a Família Tradicional Brasileira.

Na crescente de religiões neopentecostais, no conservadorismo de igrejas tradicionais e suas influências na população do Brasil, este tema, enquanto votado o Impeachment da presidenta Dilma veio atona mais uma vez. Pela minha família, pelos meus filhos, pelo meu marido ou esposa, pela família tradicional, eu quero o "fim da corrupção".
De que raios de família se fala quando colocam esses adjetivos?

Papai, mamãe e filhinhos? Do tipo propaganda de margarina? Gente que acorda maquiada, tomam café todos juntos, com fartura na mesa?
Seria cômico se não fosse bizarro querer padronizar a família a este tipo de "coisa". 
Mas isso é discussão para vários artigos e partilhas...

O que levaremos em conta aqui é a questão desta defesa da família por um grupo da sociedade que são a maioria: os cristãos.
Segundo o Censo 2010 do IBGE, cristãos contemplam 87,4% da população brasileira (Católicos 65%; Evangélicos Pentecostais e Neopentecostais 13,4%; Evangélicos de Missão 4,1%; Evangélicos Não Determinados: 4,9%). Número extremamente grande de pessoas que se autodeterminam seguidores de um profeta que lutou a favor do amor, do bem comum e do respeito. Profeta esse que denunciou o uso do templo para comércio; levantou o moral de cegos, doentes, noivos, amigos; perdoou a mulher adúltera e tomou água com a samaritana; foi julgado por dois poderes (político e religioso); foi abandonado por alguns de seus seguidores; abandonado pelo povo que tanto o apoiou nas hora que estava fazendo o bem; torturado e morto. Um preso político como gosta de chamá-lo Frei Betto.
Muitos destes cristãos são os mesmos que defendem a tal Família Tradicional Brasileira, como pretexto para julgar e condenar práticas de outrem, ainda que estes não sigam a mesma ideia moral, o que torna o julgamento um tanto infantil, superficial e desonesto.
Como posso julgar alguém que pratica algo que minha fé condena, se este alguém não pratica a mesma fé que eu? É o mesmo que julgar um crime usando a lei de outro país...

Juntando isso ao fato dito no início, sobre a violência contra a mulher, teremos o seguinte.
Usaremos duas fontes de pesquisas, já que esta área é um pouco nebulosa, pois algumas mulheres ainda têm medo de denunciar, o que dificulta o trabalho da estatística. Mas infelizmente, não é porque não há denuncia que não exista violência. Isso pode ser facilmente compreensível, todavia porque a violência sempre gera medo, medo até de se defender.
Segundo o Instituto Avon, em média 70% da violência contra a mulher acontece dentro de casa. Mas apenas 63% delas denunciam a ação violenta (aqui).
Segundo o Estadão, 85,85% da violência acontecem nestes mesmos ambientes. Sendo que 77% das vítimas têm filhos, e que 80% destes filhos presenciam a violência. 67,36% essas violências foram cometidas por pessoas com quem a vítima tinha ou já tivera vínculo afetivo.

Vamos supor, de forma muito bizarra e grotesca (para não dizer preconceituosa e não ser bem entendido) que os NÃO CRISTÃOS, na sua totalidade - 12,6%, são responsáveis pela violência (afinal, quem segue o "cara do bem" não faria isso), ainda assim, com uma soma muito patética (tirando a porcentagem de não cristãos da porcentagem de violência), teríamos mais de 57% da violência cometida por estes mesmos cristãos que pregam a Família Tradicional Brasileira. Isso se levarmos em conta a pesquisa do Instituto Avon, se usarmos os dados do Estadão, aumentaríamos em mais de 10% esses números. Nesta conta bizarra. 

Como pode então, num país que se diz, se intitula, cristão, termos estes números assombrosos com relação a violência doméstica contra as mulheres?
Os problemas das ruas também são importantes, mas não consigo entender como a Família Tradicional Brasileira pode cometer tal atrocidade!

Claro que esta comparação é muito pífia, superficial e até irreal em alguns pontos.
Claro que o ser humano, inclusive eu e você, é um ser de contradições.
Claro que não podemos generalizar, afinal temos muitos cristãos que buscam a mudança, assim como temos muitos não cristãos que levam fama atoa.
Claro que eu não tenho respostas para as perguntas e comentários.

Mas é importante pensar, e fora da caixa.

Se você é mulher e sofre violência, DENUNCIE!
Se você é homem e presencia violência, DENUNCIE!
Se você é ser humano, DENUNCIE!
Se é cristão, ateu ou tenha qualquer tipo de fé, DENUNCIE!

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